Países emergentes crescem em patentes

Há dias foi divulgada a lista de patenteadores no USPTO (sigla em inglês do escritório americano de marcas e patentes) referente ao ano de 2015. É uma oportunidade para se avaliar o ocorrido nos primeiros 15 anos deste século.
Inicialmente, cabe explicar que a patente tem valor apenas no país que a concede. Portanto, não existe uma patente mundial. A saída, embora não seja o ideal, é avaliar e comparar a concessão de patentes no seu maior mercado, ou seja, nos Estados Unidos.
A patente como medida do desenvolvimento de inovações tecnológicas não é um indicador ideal, mas é o único quantitativo com correlação direta. Ou seja, o desenvolvimento tecnológico acarreta mais patentes, mais competitividade e o crescimento da economia.
Exemplos desse processo serão vistos nesse artigo e esse é o principal interesse dessa análise. Se tivéssemos usado a subvenção econômica da Lei de Inovação certamente estaríamos entre os que crescem vemos que o número de patentes dobrou nesse período, mas os crescimentos não foram iguais.
Os EUA tiveram outorgadas 141 mil patentes no ano de 2015, crescendo 66% no século. Os demais países passaram a 157 mil nesse ano, crescendo 118% no período, ou seja, há uma progressiva dispersão da geração e controle da tecnologia. Entre os países desenvolvidos que tiveram concedidas mais de 2.000 patentes em 2015, os destaques são o Canadá, Holanda e Suíça, todos com crescimento acima de 90% no período. Japão, Alemanha, França, Inglaterra e Suécia ficaram em torno dos 70%, enquanto a Itália teve o pior desempenho, apenas 56%, reflexo de sua persistente crise econômica.
O grande destaque, porém, foram os países orientais emergentes. Mesmo os emergentes há mais tempo engajados em uma política de geração de tecnologia própria, e que por isso crescem há mais tempo, ainda assim mostram um desempenho extraordinário, quando comparados aos países tradicionais já desenvolvidos: a Coreia do Sul, do tamanho de Pernambuco e com pouco mais de 40 milhões de habitantes, multiplicou por 5,4 vezes as patentes no período, alcançando 17,9 mil, superando a Alemanha e consolidando­se como o terceiro patenteador, abaixo apenas do Japão (52,4 mil) e EUA. E mesmo Taiwan, uma ilha com cerca de 22 milhões de habitantes, multiplicou as patentes por 2,5 vezes chegando a 11,7 mil, o quinto patenteador.
Seria de se esperar que a China (incluindo Hong Kong) mostrasse a sua inexorável marcha para o domínio tecnológico, porém o seu avanço é surpreendente. Chegou a 8,7 mil patentes em 2015, que cresceram 29 vezes no período e a levaram à sexta posição, bem à frente do seguinte, o Canadá. A Índia, porém, ficou no mesmo patamar, pois cresceu suas patentes 26 vezes. E o que há em comum entre esses países para esse notável aumento das patentes? Ambos estabeleceram políticas públicas de fomento ao desenvolvimento tecnológico de inovações para alcançar competitividade e crescer.
A China, começando em 1980, optou pela indústria de manufaturas. A Índia, começando em 1996 bem após a China, deu ênfase a alguns setores industriais, mas principalmente a diversos tipos de serviços de elevados conteúdos tecnológicos como os desenvolvimentos de programas computacionais (software), química de medicamentos e ensaios clínicos, cirurgias programadas e até o próprio desenvolvimento de inovações tecnológicas para empresas de outros países.
Como seriam esses processos de crescimento tão bem sucedidos? Infelizmente é difícil a consulta às leis chinesas, além da enorme diferença de ambiente político e cultural. Com a Índia, porém, é bem mais fácil, pois devido à sua diversidade linguística as leis indianas são divulgadas em inglês. E o que nos diz a sua lei de fomento, nº 44, de 16 de dezembro de 1995?
O artigo 6º que define seus objetivos é muito claro e simples, mostrando que se criou o Conselho de Desenvolvimento Tecnológico para prover capital de risco (equity capital, em inglês), bem como qualquer outro apoio financeiro, aos empreendimentos industriais que desenvolvam tecnologias próprias ou “adaptações” de tecnologias estrangeiras para quaisquer aplicações no país. O termo utilizado (adapted, em inglês) é claramente um eufemismo para a cópia, que assim ficou consagrada e incentivada.
Hoje a Índia é o país que mais cresce. Cresceu 283% entre 1995 e 2014, enquanto que o Brasil só cresceu 80% no período. Esses dois últimos países estavam atrás do Brasil, quando iniciaram a sua trajetória ascendente. O que aconteceu conosco?
Alcançamos a aprovação de 323 patentes em 2015, um crescimento de 3,3 vezes nesses 15 anos. Mas isso não conta a verdade, pois ficamos parados por 10 anos e crescemos apenas nos últimos cinco anos porque tivemos os incentivos fiscais da Lei do Bem, ou seja, praticamos somente um pouco e por pouco tempo o que China e Índia fazem em larga escala, assim como ainda fazem Coreia e Japão.
Quando vamos nos desprover dos preconceitos e aprender que é a indústria permanentemente inovada (ou o serviço de alto conteúdo tecnológico) que fazem o crescimento aceleradamente, o verdadeiro PAC? Mas há algo muito importante a lembrar: somente o compartilhamento do risco tecnológico entre Estado (através das suas agências ou órgãos) e a indústria vai viabilizar a necessária universalização do fomento à inovação.
Após mais de 15 anos de insistência em financiamentos subsidiados, vemos que isso resultou em muito, muito pouco. O que valeu mesmo foi o incentivo do pequeno compartilhamento da Lei do Bem, e ainda assim restrito a grandes empresas. Se tivéssemos usado amplamente o mecanismo da subvenção econômica criado pelo artigo 19 da Lei de Inovação (à semelhança da lei indiana) certamente estaríamos entre os que crescem. Temos a nossa chance agora com a mudança dos ventos. Vamos desperdiçá-­la mais uma vez?
 
Roberto Nicolsky é físico e diretor-presidente da Sociedade Brasileira Pró-­Inovação Tecnológica (Protec)
Publicado no jornal Valor de 29 de junho de 2016

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