A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a notificação feita exclusivamente por e-mail não é suficiente para autorizar a inscrição de consumidor em cadastro de inadimplentes.
De acordo com o Colegiado, a prévia notificação, prevista no artigo 43, §2º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), deve ser feita por meio do envio de correspondência ao endereço do consumidor, não bastando a sua realização por meio eletrônico.
No caso dos autos, um consumidor que teve seu nome negativado ajuizou uma ação de cancelamento de registro com pedido de indenização contra um órgão responsável pela inscrição em cadastro de inadimplentes, alegando violação do CDC por ausência da devida notificação prévia para a negativação de seu nome.
Tanto o Juízo de primeiro grau, como o Tribunal de Justiça do Rio Grande de Sul (TJ/RS) decidiram pela improcedência do pedido formulado na inicial, por entenderem legítima e suficiente a notificação da inscrição do cadastro negativo exclusivamente por e-mail.
O consumidor recorreu ao STJ, reiterando a ofensa ao código consumerista consistente na alegação de que a notificação sobre a inscrição em cadastro de inadimplentes não pode ser feita por meio eletrônico.
Assim, no STJ, a questão girou em torno de saber se bastaria a notificação por e-mail para atender à determinação do artigo 43, §2º, do CDC[1], para a inscrição do consumidor em cadastro de inadimplentes.
Ao julgar o REsp 2.070.073/RS, o STJ decidiu que não se pode permitir que a notificação do consumidor para essa finalidade seja realizada apenas mediante comunicação eletrônica.
Para assim decidir, a relatora do processo, ministra Nancy Andrighi, lembrou que o Direito do Consumidor existe para reequilibrar a relação entre consumidores e fornecedores de produtos e serviços, cuidando para que a parte vulnerável da relação, o consumidor, esteja protegido contra práticas comerciais abusivas.
Ou seja, todo o sistema de proteção do consumidor, incluindo os princípios e regras que regem as relações de consumo, existe para proteger a parte mais vulnerável da relação consumerista.
Partindo dessa premissa, a ministra relatora fez uma análise sobre a finalidade do artigo 43, §2º, do CDC, afirmando que a entidade mantenedora do cadastro de inadimplentes tem a obrigação de comunicar previamente o consumidor acerca da inscrição, para que ele tenha a oportunidade de:
1 – Pagar a dívida e, assim, impedir a negativação ou
2 – Adotar medidas extrajudiciais ou judiciais para se opor à negativação, quando for o caso.
Em outras palavras, não se pode admitir que o consumidor seja simplesmente comunicado sobre a inscrição de seu nome no cadastro, devendo lhe ser dada a efetiva oportunidade de evitar a inclusão, se assim desejar.
Sobre o assunto, a ministra Nancy Andrighi consignou o teor de duas importantes súmulas editadas pelo STJ: a súmula 359, que impõe ao órgão mantenedor de Cadastro de Proteção de Crédito a notificação do devedor antes da sua inscrição, e a súmula 404, que relativiza a mencionada exigência, dispensando o aviso de recebimento (AR) na carta de comunicação ao devedor sobre a negativação de seu nome[2].
A esse respeito, a ministra relatora ponderou que, mesmo com a flexibilização da regra consubstanciada na dispensa do aviso de recebimento, os precedentes que deram origem à súmula 404 não deixaram de exigir que a notificação prevista no artigo 43, §2º, do CDC, seja realizada mediante o envio da correspondência à residência do consumidor.
Com efeito, de acordo com a ministra relatora, a referida súmula já proporcionou significativa flexibilização da regra, de modo que permitir a notificação exclusivamente por e-mail ou por SMS diminuiria a proteção do consumidor além do que se pode admitir.
Em sua decisão, a ministra Nancy Andrighi lembrou, ainda, que a sociedade brasileira é permeada por profundas diferenças sociais e econômicas e que, em razão disso, nem todas as pessoas possuem um computador ou aparelho celular com internet, o que dificulta ou até mesmo impede o acesso aos e-mails enviados.
Esse fator, segundo a ministra, fortalece ainda mais a vulnerabilidade técnica, informacional e socioeconômica do consumidor.
Por fim, a ministra relatora apontou os nefastos efeitos da negativação do nome do consumidor em cadastros de inadimplentes, questão que diz respeito à própria dignidade do devedor, razão pela qual a inscrição deve ser feita excepcionalmente e nos termos da lei.
Nesse contexto, o STJ determinou o cancelamento da inscrição do consumidor no cadastro de inadimplentes por ausência de devida notificação prévia exigida pelo CDC, fixando o entendimento de que a comunicação prévia apta a autorizar a inscrição do devedor no cadastro de inadimplentes deve ser enviada ao endereço do consumidor, ainda que desprovida de aviso de recebimento.
Os advogados do escritório Edgard Leite Advogados Associados estão à disposição para quaisquer esclarecimentos sobre o assunto.
[1] Art. 43, §2º, CDC – A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.
[2] Súmula 359 do STJ: Cabe ao órgão mantenedor do Cadastro de Proteção ao Crédito a notificação do devedor antes de proceder à inscrição.
Súmula 404 do STJ: É dispensável o aviso de recebimento (AR) na carta de comunicação ao consumidor sobre a negativação de seu nome em bancos de dados e cadastros.
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