Autor: Edgard Hermelino Leite Junior, sócio do escritório Edgard Leite Advogados Associados.
Recentemente, a imprensa tem noticiado enfaticamente o desvirtuamento do instituto da "penhora on-line", a qual consiste na constrição de quantias em dinheiro, efetivada diretamente em contas bancárias para garantia do Juízo, em processos em fase de execução.
O sistema, criado em 2002, por meio de convênio firmado entre o Superior Tribunal do Trabalho e o Banco Central, visa à celeridade da execução, a fim de satisfazer os créditos trabalhistas. Posteriormente, foi estendido para todo o Judiciário e definitivamente regulamentado pela Lei Federal nº 11.382/2006.
Esse diploma instituiu o art. 655-A no Código de Processo Civil estabelecendo: "Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução."
A norma é clara ao dispor que o bloqueio do numerário deverá ocorrer em obediência ao valor executado. Aliás, nosso Ordenamento repudia o chamado "excesso de penhora", elencando este item no rol de matérias suscetíveis de impugnação em Embargos à Execução.
Contudo, na prática os bloqueios vêm sendo realizados integralmente, ou seja, todos os valores existentes em todas as contas bancárias da pessoa executada ficam indisponíveis.
Tal procedimento, mais usual na Justiça do Trabalho, acaba por prejudicar de forma inestimável o executado.
A situação é agravada quando empresas são executadas. Imagine-se o caso de uma empresa que sofra o bloqueio de todas as suas contas bancárias. Com isso, todas as suas movimentações financeiras cessam, e seus compromissos deixam de ser honrados, sobretudo com relação a fornecedores e empregados. Cria-se, portanto, um círculo vicioso capaz de levar a empresa ao colapso.
Ademais, a penhora on-line em sede de execução provisória (fase em que ainda cabem recursos) é uma prática constante, apesar de a Súmula nº 417do TST vedar a penhora em dinheiro nessa fase, se o devedor oferecer bens (para garantir o pagamento).
Entretanto, há situações ainda piores. Em que pese a personalidade jurídica das empresas regularmente constituídas não se confunda com a de seus sócios, diretores ou administradores, a lei prevê a possibilidade de a responsabilidade por atos praticados pelas empresas recair sobre aqueles últimos, "em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial", situação em que "pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica" (art. 50 do Código Civil).
Percebe-se que os sócios ou administradores somente podem responder pelos débitos quando demonstrada a existência de dolo ou má-fé. Contudo, em não sendo encontrados bens suficientes para o pagamento por parte da empresa, basta ao credor informar ao Juízo o nome dos sócios, diretores e administradores para que todos tenham suas contas bloqueadas.
O Código Civil estabelece, em seu art. 1.003, que a responsabilidade do sócio estende-se pelo prazo de dois anos após sua retirada da empresa (entendimento aplicado aos diretores e administradores, segundo a jurisprudência). Ainda assim, muitas vezes, quem não integrou os quadros da empresa na época correspondente à assunção da obrigação ou no período do contrato de trabalho do reclamante, acaba responsabilizado.
Conforme se percebe, é chegado o momento de a penhora on-line ser repensada. Salientamos que a essência do instituto é louvável, pois objetiva a celeridade processual, bem como o cumprimento de obrigações. Todavia, é necessário que o Ordenamento seja respeitado, uma vez que há regras certas e determinadas para a persecução de créditos, assim como direitos previstos às pessoas executadas.
Diante disso, com relação a reclamações trabalhistas, indica-se um constante monitoramento, pelos empregadores, das ações em trâmite perante suas empresas, sobretudo por parte dos sócios e administradores, ainda que não mais integrem os quadros da empresa. O mesmo se recomenda quanto à Justiça Comum, apesar de a possibilidade de ocorrência da desconsideração da personalidade jurídica, tal como se dá na Justiça do Trabalho, seja menor.
É importante que os executados nunca deixem os processos tramitarem à sua revelia, sob pena de uma possível fraude (abuso da personalidade jurídica) restar caracterizada, ensejando a penhora on-line.
Por fim, vale lembrar que a penhora on-line de imóveis está prestes a ser iniciada, tendo em vista o convênio firmado com a ARISP – Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo.
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