Abandono afetivo x dever de indenizar

Autora: Renata Santos Barbosa Catão, advogada integrante de Edgard Leite Advogados Associados.

 

Recentemente, chegou aos Tribunais Superiores matéria referente ao abandono afetivo como motivo para gerar o dever de indenizar.

Tratou-se, especificamente, de ação judicial movida pelo filho contra o pai, que apesar de cumprir com o dever de assistência material, ao arcar regularmente com a pensão alimentícia, era totalmente omisso quanto ao “dever” de assistência psíquica, moral e afetiva. A ação foi julgada improcedente por entender o I. Magistrado que “não houve descaso intencional do réu para caracterizar o abandono paterno”.

Em sede de recurso, O Tribunal de Justiça de Minas Gerais entendeu de forma diversa e assentou que “a responsabilidade em comento deve cingir-se à civil e, sob este aspecto, deve decorrer dos laços familiares’, reformando a sentença com a conclusão de que havia sim o nexo causal entre o dano à dignidade do filho e a conduta ilícita do pai de não formar laço paternal com aquele.

Admite-se hoje existir uma crise da paternidade. Isso porque a partir da Cosntituição Federal que igualou homens e mulheres e diante de tantas alterações no âmbito social, não há mais que se falar no modelo de família patriarcal, as funções de pai e mãe se confundem e por isso geram tanta dificuldade, principalmente aos pais de assumir , ou até mesmo reconhecer, que possuem “direito/dever de participar da formação, convivência afetiva e desenvolvimento de seus filhos” (Pai, por que me abandonaste? – Rodrigo da Cunha Pereira).

Sabe-se que com relação ao abandono material, o próprio direito tem como corrigir essa falta através de sanções, inclusive pena de prisão. Contudo, no que se refere ao “abandono afetivo”, que certamente pode ser considerado o mais grave, há grande divergência, face à ausência de previsão de penalidade.

Aliás, as conseqüências que conhecemos na lei é a perda do poder familiar. Ocorre que a discussão vai muito além, refere-se à falta de afeto. Consoante constou da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, no caso apontado inicialmente: “escapa ao arbítrio do Judiciário obrigar alguém a amar, ou a manter um relacionamento afetivo, nenhuma finalidade positiva seria alcançada com a indenização pleiteada.”

O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha ainda observou que: “com a devida vênia, não posso, até repudio essa tentativa, querer quantificar o preço do amor. Ao ser permitido isso, co o devido respeito, iremos estabelecer gradações para cada gesto que pudesse importar em desamor.”

Por outro lado, manifestou-se o Sr. Ministro Barros Monteiro declarando voto-vencido que “o danos está evidenciado com o sofrimento, com a dor, com o abalo psíquico sofrido pelo autor durante todo esse tempo. (…) Penso também, que a destituição do poder familiar, que é uma sanção do Direito de Família, não interfere na indenização por dano moral”.

Entendemos, por fim, em que pese os argumentos de ambos os lados, de que não há como negar que o exercício da paternidade é uma obrigação jurídica, estabelecida na Constituição Federa, no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Civil.

Assim dizer que não cabe reparação civil pelo abandono afetivo é o mesmo que desresponsabilizar os pais pela criação e educação de seus filhos.

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