Entraves no licenciamento ambiental – como enfrentá-los

Autora: Marcia Heloisa Pereira da Silva Buccolo, consultora jurídica do escritório Edgard Leite Advogados Associados.

 

As dificuldades encontradas pelos empreendedores na implementação e, posterior, aprovação de obras, especificamente em relação ao licenciamento ambiental, têm sua origem na falta de preocupação com a avaliação dos impactos ambientais que serão provocados em decorrência da execução de determinado empreendimento.

Ocorre que, no momento em que estão sendo projetados, planejados e estruturados os serviços e obras de implantação e operação de programas/projetos públicos ou privados, todos os envolvidos (sejam administradores públicos ou interessados privados) centram seus esforços, estudos e análises técnicos na estruturação econômica e técnica do empreendimento, deixando para se preocupar com o licenciamento ambiental, somente após a efetiva realização do negócio, ou seja, no momento de sua implantação, ou, até mesmo, depois, quando iniciada a “via crucis” dos licenciamentos.

Indiscutivelmente, são bastante significativos, os custos decorrentes da adoção das necessárias medidas mitigadoras ou compensatórias ambientais, em razão da implantação de projetos, atividades ou empreendimentos potencialmente degradadores do meio ambiente. Entretanto, tais despesas sequer são consideradas quando da estruturação econômico-financeira de um determinado empreendimento privado, não sendo apropriados os custos (ainda que minimamente considerados) das providências ambientais que, muitas vezes, serão exigidas.

A mesma despreocupação se verifica quando da elaboração de Orçamentos-referência elaborado pela Administração Pública, os quais, por tal razão, não estão contemplados na estruturação da Proposta de Preços, vencedora da Licitação. E tal imprevisão, mais uma vez, ocorre em conseqüência do mal planejamento da contratação, tanto por parte do Poder Público quanto dos interessados privados.

Na prática, em tais casos, geralmente o que se verifica é que, no desenrolar da execução dos contratos de execução de obras (públicas ou privadas), depara-se com o seguinte impasse: a execução contratual não poderá ser iniciada ou desenvolvida sem os indispensáveis licenciamentos ambientais e a adoção de eventuais medidas mitigadoras e/ou compensatórias dos impactos provocados pela implantação do empreendimento, que podem ser motivadas pela necessidade de adoção de medidas para redução dos impactos na fauna e na flora locais; ou, até, de remoção e indenização da população instalada no local e entorno (caso típico da construção de barragens e usinas hidrelétricas, ou de rodovias, por exemplo), ou, ainda, de obtenção das autorizações ambientais para interferência na vegetação existente no terreno, (caso corriqueiro, nos empreendimentos privados urbanos) como ocorre, corriqueiramente.

A falta de adoção, no momento oportuno, de qualquer uma dessas providências, fatalmente implicará em atrasos no cronograma de execução da obra, e via de conseqüência, em sérios prejuízos financeiros, além do desgaste à imagem dos empreendedores, de difícil reparação.

Todos esses entraves, originados, via de regra, da falta de planejamento, decisões e ações adequadas, podem –– e deveriam — ser evitados, através de realização de uma avaliação ambiental estratégica prévia, consistente e séria, a poderá ser considerada como a matriz dos futuros licenciamentos: Licença Prévia, Licença de Instalação e Operação, ou Certificado de Conclusão de Obra).

O que se constata, nos dias atuais, é que os empresários preferem postergar tais ações e alocação dos respectivos custos, para outro momento, – até mesmo quando já estiverem com as obras em andamento – agindo, reativamente, quando lhe serão exigidas respostas pelas condutas irregulares, ou, pior, reparação por danos ambientais, arcando, então, com pesadíssimas multas e significativas despesas, além dos dissabores que envolvem tais situações.

Apesar de investirem massivos recursos financeiros na ampla divulgação da mídia – especialmente, quando se trata de empreendimentos de grande magnitude, de interesse da população ou de forte impacto financeiro – não raras vezes, deixam de agir, no momento oportuno, e de contribuir, efetivamente, para que a contratação seja a mais adequada possível.

Ante tal cenário, para responder pelas dificuldades de correção de curso, em especial as necessárias para viabilizar o licenciamento ambiental, eventualmente, serão obrigados a esforços adicionais e de alto impacto financeiro. E, mais, em se tratando de execução de obras públicas, devem ser adicionados os importantes impactos sociais.

Não se pode esquecer que os impactos decorrentes da paralisação ou retardamento no início das obras públicas extrapolam o aspecto financeiro, na medida em que comprometem o atendimento ao Interesse Público, frustram a população, em razão da falta de prestação de determinados serviços públicos, mormente os de natureza essencial, como os de transporte, infraestrutura, saneamento básico, etc. Ademais, os custos financeiros serão repassados, em última análise, à população, usuária de tais serviços.

Imprescindível para a realização de qualquer empreendimento, que, ao se iniciar o planejamento de qualquer empreendimento, além do planejamento estratégico, (com a identificação e emprego das tecnologias mais avançadas de método construtivo, de estratégias eficientes e eficazes de gestão e administração) sejam contemplados, com a mesma preocupação e igual importância, os aspectos legais e ambientais, através do competente planejamento jurídico-ambiental.

O cuidado deverá ser o mesmo, seja para adquirir um imóvel para desenvolvimento de uma planta industrial, implantação de plataformas energéticas, construção/exploração de rodovias/ferrovias, ou implantação e/ou operação de equipamentos de infraestrutura.
Não se afigura razoável pretender planejar e realizar qualquer empreendimento público ou privado, sem que tal iniciativa seja acompanhada da indispensável consultoria jurídica especializada, que avaliará todas as implicações legais e identificará as ações necessárias para:

– de um lado, minimizar os riscos de paralisação, ou elevação dos custos, por força de questionamentos administrativos ou judiciais, responsabilizações ou imputações de penalidades administrativas ou ambientais, e,

– de outro, assegurar a melhor sinergia possível entre as diversas equipes envolvidas, prevenindo conflitos, removendo obstáculos legais, direcionando as ações, nos termos da legislação vigente, e evitando custos e riscos desnecessários.

O principal obstáculo, sempre apontado como o maior “vilão” pelos empreendedores privados, na obtenção dos licenciamentos ambientais, é a insuportável demora no seu processamento, acarretando grandes atrasos no cronograma de execução das obras e serviços contratados, com impactos significativos nos seus custos finais, impactos esses, que serão ainda mais graves, caso ocorram de disputas judiciais, iniciadas pelos representantes do Ministério Público, ou por demais órgãos de controle.

Onde estaria o gargalo que provoca essa morosidade na expedição das licenças necessárias para a implantação de empreendimentos privados ou dos programas e projetos públicos? Qual a principal razão das discussões judiciais de iniciativa do Ministério Público, independentemente de se tratar de obra pública ou privada? Qual o principal motivo das ações judiciais que impedem a conclusão de obras prioritárias de infraestrutura, como: as de saneamento básico, sistema viário, eletrificação ou transportes?

Se por um lado a identificação do problema é simples, o seu equacionamento precisa ser encarado com maior acuidade.

O planejamento jurídico adequado, compreendendo a fase preliminar de estruturação do empreendimento, acompanhado do respectivo apoio especializado durante toda a sua realização, deve ser encarado como um entre os itens considerados na concepção de qualquer empreendimento. Deve fazer parte das providências necessárias e dos respectivos custos considerados para a sua implantação.

Partindo-se desta premissa, serão evitados, no mínimo: o desgaste e os custos adicionais decorrentes das suspensões dos contratos ou da paralisação de obras, motivadas por questões ambientais; a morosidade, ou mesmo, a dificuldade no enfrentamento dos problemas ambientais que deverão ser equacionados, para a obtenção dos licenciamentos administrativos e ambientais, caso verificados tardiamente.
Há necessidade do extremo cuidado, por parte dos empreendedores, na elaboração dos inúmeros documentos ambientais, hoje previstos e exigidos, caso a caso, pela legislação, como condição para o licenciamento ambiental: Estudo de Impacto Ambiental – EIA; Relatório de Impacto Ambiental – RIMA; Plano de Controle Ambiental – PCA; Relatório de Controle Ambiental – RCA; Plano de Recuperação de Áreas Degradadas – PRAD; Estudo Ambiental Simplificado – EAS; Relatório Ambiental Preliminar – RAP; Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos – PGRS; Estudo de Viabilidade Ambiental – EVA; Estudo de Impacto de Vizinhança – EIV; Memorial de Caracterização do Empreendimento – MCE. Entretanto, não basta a sua simples elaboração. Tais documentos deverão ser juridicamente consistentes e tecnicamente bem elaborados e confiáveis.

Com a adoção de medida profilática, muitas das exigências de correções e complementações de informações técnicas, por parte órgãos licenciadores, serão eliminadas, conferindo agilidade na conclusão do procedimento de licenciamento e obtenção das licenças ambientais. E, principalmente, os pesados custos decorrentes da responsabilização das empresas por danos e crimes ambientais farão parte do passado.

A título ilustrativo, lembramos interessante comentário da então Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, quando discursava sobre o tema das paralisações das obras públicas de relevante interesse para a população, no sentido de que: “cerca de 50% dos investimentos que dizem estar paralisados por problemas ambientais estão na verdade parados por ações do MP [Ministério Público]. Segundo a ex-Ministra, “o MP não faz isso porque quer perseguir ninguém, faz porque de fato não houve cumprimento da legislação” (fonte: site; “www.socioambiental.org. Artigo: Investimento de peso pelo enfraquecimento do licenciamento ambiental – 05.04.2004).

As observações anteriores são absolutamente pertinentes para quaisquer empreendimentos sejam privados ou públicos, visto que estes últimos não estão dispensados do licenciamento.

Concluindo, objetivamente, respondemos à indagação inicial, elencado as providências mínimas, absolutamente essenciais para o enfrentamento dos entraves ao licenciamento ambiental e redução dos riscos decorrentes do descumprimento da legislação ambiental:

• O cuidado no planejamento dos projetos, o qual deverá contemplar todos os aspectos, técnicos, econômico-financeiros, jurídico-legais e sócio-ambientais;

• O cuidado na elaboração das planilhas de custos que representarão o orçamento final da obra, computando-se as verbas necessárias ao planejamento jurídico-ambiental e à implementação das medidas que serão exigidas quando do licenciamento ambiental (identificadas nos respectivos documentos ambientais),a fim de promover à correta identificação de todas as exigências previstas na legislação, e aplicáveis ao caso e da melhor forma de atendê-las.

• De modo geral, nos termos da legislação vigente, as licenças ambientais essenciais à implantação de empreendimentos de infraestrutura em geral se referem a 3 fases:

a) Licença Prévia (LP): que deve ser providenciada na fase preliminar do planejamento da atividade ou empreendimento, com ênfase para os requisitos básicos que deverão ser atendidos nas demais fases (localização, instalação e operação). Para a expedição dessa licença deverão ser atendidas a legislação federal, estadual e municipal, (esta última, em especial no que se refere ao zoneamento e uso e ocupação do solo).

Nesta fase, deve ser apresentado, quando exigível, o EIA/RIMA que deverá atender ao Termo de Referência, que é disponibilizado pelo órgão licenciador.

b) Licença de Instalação (LI): que autoriza o início da implantação, de acordo com o Projeto Executivo do empreendimento;

c) Licença de Operação (LO): que autoriza o início da atividade e o funcionamento dos equipamentos necessários, com atenção ao controle da poluição, e da degradação ao meio ambiente, nos termos previstos nas licenças obtidas nas fases anteriores.. Tal Licença somente será concedida após as verificações necessárias do órgão licenciador competente.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *