Subcontratação e faturamento direto nos contratos administrativos

 

Autor: Philippe Ambrosio Castro e Silva, integrante do escritório Edgard Leite Advogados Associados.

 

O instituto da subcontratação, no âmbito dos contratos administrativos, constantemente apresenta diversos pontos polêmicos, os quais, muitas vezes, são levados ao crivo do Poder Judiciário, sobretudo no que diz respeito ao suposto caráter personalíssimo daqueles contratos.

Dentre tais controvérsias, observa-se cada vez com maior freqüência o surgimento de dúvidas acerca da forma de as pessoas subcontratadas faturarem os serviços por elas prestados.

O art. 72 da Lei das Licitações e Contratos Administrativos (Lei Federal nº 8.666/93) autoriza a subcontratação, desde que expressamente prevista nas regras e determinações exaradas do ente ou órgão contratante.

Logo, o permissivo deve encontrar-se inserido no edital do certame licitatório, bem como no instrumento contratual, sob pena de a subcontratação, caso realizada, tornar-se nula, ensejando, por conseguinte, a rescisão do negócio jurídico, de maneira unilateral, pela Administração Pública, com fulcro no art. 78, VI, da Lei nº 8.666/93.

Isso porque a possibilidade da subcontratação em um determinado contrato consiste em uma opção da Administração Pública, pautada em critérios de conveniência e oportunidade, uma vez que se entende que o contrato administrativo é caracterizado pela impessoalidade (ressalvadas opiniões contrárias), de modo que à Administração interessa a efetiva prestação ou entrega do objeto contratual, observados, evidentemente, os princípios e normas que regem a Licitação e o Direito Administrativo como um todo.

Conforme assevera Maçal Justen Filho, ”a identidade do executante da prestação até pode ser irrelevante, desde que o contratado se responsabilize pela perfeição do adimplemento. (…) A lei autoriza, porém, que a Administração, em cada caso, avalie a conveniência de permitir a subcontratação, respeitados os limites predeterminados.”

Sendo a subcontratação admitida nos limites estabelecidos no ato convocatório, bem como no contrato, o contratado poderá subcontratar terceiros, ficando a Administração facultada a aprová-los ou não.

Isso, no entanto, não influencia na extensão da relação jurídica criada a partir da subcontratação, uma vez que o terceiro subcontratado somente se vincula ao subcontratante, não integrando a relação deste último para com a Administração Pública.

Conseqüentemente, a responsabilidade pela execução do contrato perante a Administração permanece sendo integral do contratado, não havendo que se cogitar de redução, cessão ou transferência da responsabilidade de parte da execução dos serviços ao subcontratado, sobretudo porque a subcontração não se confunde com cessão parcial do contrato.

Como se vê, em virtude de sua natureza jurídica, bem como dos efeitos gerados no tocante à responsabilidade no âmbito da relação jurídico-contratual original, a subcontratação pode trazer alguns riscos à Administração Pública, de modo que é extremamente recomendável sua anuência em relação ao particular subcontratado, sem se olvidar do acompanhamento atento e rigoroso dos serviços executados, tal como se estivessem sendo prestados pelo contratado principal.

Evita-se, assim, a discussão futura sobre a pessoa responsável por eventual inadimplemento, privilegiando-se, desde o início, o acompanhamento e as atenções para com o cumprimento do objeto contratual em si, ou seja, o fim almejado pela Administração.

Para tanto, o faturamento direto pela empresa subcontratada consiste em mais uma forma de fiscalização, por parte da Administração, quanto aos serviços prestados, possibilitando, assim, um controle efetivo quanto às prestações adimplidas pelo subcontratado, sem que essas informações sejam levadas, inicialmente, ao contratado principal e posteriormente à Administração, acarretando, conforme mostra a experiência, a omissão de dados importantes, os quais somente serão conhecidos quando do inadimplemento do contrato, gerando prejuízos ao interesse público.

Finalmente, é imperioso destacar que o faturamento direto não consiste apenas em uma medida preventiva sem base legal, uma vez que está previsto no art. 308 do Código Civil (que se aplica subsidiariamente aos contratos administrativos, nos termos do art. 54, da Lei nº 8.666/93), senão vejamos:

 ”Art. 308. O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente, sob pena de só valer depois de por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu proveito.”

O citado dispositivo pode ser interpretado e aplicado à situação ora estudada sob dois enfoques.

O primeiro diz respeito à figura do representante. Isto porque, ao faturar diretamente, a empresa subcontratada estaria agindo como representante da contratada principal, credora na relação jurídica estabelecida com a Administração, no tocante aos valores referentes aos serviços executados pela subcontratada.

Aliás, a representação ou mandato já estaria explícita no contrato administrativo, uma vez que a Administração contratante e a empresa contratada já pactuariam de imediato a indicação do subcontratado, atendendo, assim, à primeira parte do disposto no art. 308, do Código Civil e, por conseguinte, às características da subcontratação, sobretudo no tocante à existência de um terceiro estranho à relação credor/devedor.

Quanto ao segundo enfoque, o faturamento direto e, conseqüentemente, o pagamento direto ao subcontratado, poderia ser entendido à luz da parte final do art. 308, uma vez que traria proveito ao contratado principal, pois é indiscutível que o desoneraria dos pagamentos dos valores relativos aos serviços executados pelo subcontratado.

Além disso, o pagamento efetuado pela Administração nessa hipótese sequer necessitaria da ratificação do contratado principal. Nesse sentido, o ilustre civilista Sílvio Rodrigues, ao discorrer acerca do art. 308, do Código Civil, destaca:

”Entretanto, se a despeito de o accipiens não ser o credor, nem seu representante, a prestação beneficiou direta ou indiretamente, parcial ou totalmente, ao credor, o pagamento é válido até o montante do benefício.”

Isso posto, conclui-se que inexistem óbices legais quanto à possibilidade de eventuais empresas subcontratadas faturarem os serviços por elas prestados diretamente à Administração Pública contratante, uma vez que atuarão como representantes da empresa contratada, sem se olvidar que tal medida beneficiará direta e integralmente esta última, nos termos do art. 308 do Código Civil.

Ademais, uma vez que as eventuais empresas subcontratadas não se vincularão juridicamente à Administração e, assim, não terão responsabilidades para com a mesma no âmbito do contrato administrativo, o faturamento direto consiste em importante medida fiscalizatória no tocante aos serviços executados pelas subcontratadas, privilegiando, portanto, o interesse público.

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