Foi publicada recentemente a Lei nº 14.596/2023, conversão da Medida Provisória nº 1.152/2022, que implementou no sistema tributário brasileiro novas regras sobre os preços de transferência, alinhando o Brasil aos critérios internacionais sobre o assunto.
Preços de transferência são os preços praticados em operações como a compra e venda de bens, serviços e direitos entre partes relacionadas que operem em diferentes países. É o caso, por exemplo, das transações comerciais e financeiras entre empresas pertencentes a um mesmo grupo econômico, localizadas em países distintos.
A legislação sobre os preços de transferência busca impedir que as partes envolvidas nesse tipo de transação pratiquem preços artificiais em relação à realidade do mercado, transferindo os lucros para países em que a tributação é mais branda.
Busca-se evitar, igualmente, que os países envolvidos nessas operações deixem de receber os tributos devidos em decorrência dessas transações.
No âmbito internacional, o Comitê de Estudos Fiscais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) cuidou de estabelecer as normas sobre os preços de transferência. Aqui no Brasil, as regras sobre o tema foram introduzidas pela Lei nº 9.430/1996.
Agora, a Lei nº 14.596/2023 vem disciplinar as regras dos preços de transferência relativas ao Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), para pessoas domiciliadas no Brasil, que realizem transações controladas com partes relacionadas no exterior.
Abaixo, um quadro com as principais alterações.
Antes da Lei 14.596/23 | Depois da Lei 14.596/23 | |
PRINCÍPIO ARM´S LENGTH |
Adoção parcial do princípio.
· Adotado internacionalmente, seguindo as diretrizes determinadas pela OCDE.
· Leis brasileiras não o previam expressamente. |
Adoção total do princípio:
· Métodos de apuração das operações serão balizados por transações similares praticadas por empresas independentes. |
MÉTODO PARA FIXAÇÃO DO PREÇO DE TRANSFERÊNCIA |
Sistemática de margens fixas:
· Margens de lucro sobre atividades são previamente determinadas. · Não há possibilidade de ajustes. |
Aplicação do princípio Arm´s Length:
· Preços de transferência serão calculados por meio de testes de comparabilidade. · Admite ajustes para adequar a base de cálculo do IRPJ e do CSLL e o preço da transação ao princípio Arm´s Length. |
ANÁLISE DE COMPARABILIDADE |
Feita por meio de métodos preestabelecidos de margens fixas.
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Comparação entre os termos da transação controlada e as condições que seriam estabelecidas entre partes não vinculadas em transações semelhantes. |
OPERAÇÃO COM INTANGÍVEIS | Não se aplicava aos intangíveis. | Aplica-se aos intangíveis e traz regras específicas para esse tipo de operação. |
COMMODITIES |
· Existência de métodos específicos: PCI (Preço sob Cotação na Importação) e PECEX (Preço sob Cotação na Exportação);
· Informações confiáveis se restringiam aos preços públicos.
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· O Preço Independente Comparável (PIC) é o mais apropriado para definir o preço da commodity, quando houver informações confiáveis.
· “Informações confiáveis” passa a incluir a utilização de comparáveis internos. |
DEDUTIBILIDADE DOS ROYALTIES | · Limitação de até 5% da receita líquida obtida para a dedução. |
· Permitida a dedução integral, observadas as condições estabelecidas na lei.
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A norma prevê, ainda, que para assegurar que as condições estabelecidas na transação estejam de acordo com o princípio do Arm´s Length, serão necessários o delineamento e a análise minuciosa de comparabilidade da transação controlada, na forma detalhada pelos artigos 6º a 10º da nova lei.
Conforme dito, a depender do resultado dessas análises, chegando-se à conclusão de que há a necessidade de adequação da base de cálculo do IRPJ e do CSLL ao princípio do arm´s length, ajustes poderão ser realizados.
A esse respeito, aliás, a nova lei prevê a aplicação de multas, que podem variar de 20 mil a 5 milhões de reais, aos contribuintes que deixarem de apresentar a documentação que demonstre a conformidade entre as bases de cálculo do IRPJ e do CSLL e os preceitos da lei.
As regras passam a ser obrigatórias a partir de 1º de janeiro de 2024.
Contudo, dada a relevância do assunto, é possível optar pela antecipação da aplicação do novo sistema para este ano, pedido que deverá ser formalizado em setembro de 2023 pelos interessados.
Apesar de a nova lei trazer regras mais complexas, que exigirão uma análise econômica cuidadosa a respeito das transações, a novidade legislativa é bastante benéfica por alinhar o Brasil com as regras internacionais sobre o assunto.
Consequentemente, a nova legislação cria uma coerência internacional na regulação do assunto, o que proporciona maior segurança jurídica aos contribuintes e o aumento na confiança de investidores, conferindo maior atratividade para investimentos no país.
A equipe de Direito Tributário do escritório Edgard Leite acompanhará a evolução do assunto e permanece à disposição para quaisquer esclarecimentos sobre o tema.
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